E em mim já é noite. Não consigo dormir. O meu corpo anseia por algo que nem de longe nem de perto consigo reconhecer. A imagem nublada que se esbate no meu caminho é demasiado pardacenta. Os contornos não se definem, não me definem. O que acontecer só a mim pertencerá. Só não me quero perder. Tu és pele de mim, e eu não tenho certezas. A metade que é, já não é a metade certa. Sento-me ao meu colo, e só peço que não te percas agora. Estou confusa, deito as mãos à cabeça e reconheço em mim o pássaro livre que sou, que desde que foste embora eu me tornei. A jaula já não é a mim que compete. Sou livre, sou infinita.
Todos os dias são dias. E hoje é um dia de deixar ir. O meu âmago converge em si, sou do tamanho da palma da tua mão, fecha-a, fecha-me. Um dia vais poder abrir os braços, abrir as mãos, deixar-me voar. E eu farei de ti o mesmo. Talvez os movimentos das minhas asas se estejam a tornar repetitivos. Talvez até nem tenha asas. Quero suster-me em mim. Deixo-te ir. Faço figas, rezo baixinho, que o teu caminho não torne a mim, não serei capaz de te mandar de volta, outra vez.
A vida é esquisita. Sou pássaro de mim e sei que o meu canto baixo permanece em ti como o rufar do teu peito permanece em mim. O meu espírito livre não me permite. Vai, vai e não voltes.